Acesso 2021: Devemos replicar 2020?
O Governo tem anunciado que brevemente irá divulgar as medidas e alterações ao processo de conclusão do Ensino Secundário e de todo o processo de Acesso ao Ensino Superior.
Nesse pacote de medidas, já foi anunciado que os exames nacionais serão adiados, devido ao novo calendário letivo, mas ainda ficam por esclarecer muitas informações, tais como quais os exames a realizar e como tudo isto terá em conta para a fórmula de cálculo das notas de candidatura.
Antecipando a tomada de decisão dos vários decisores políticos, a Inspiring Future enviou na semana passada, tanto para o Ministério da Educação, como para a Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior, uma ampla análise e várias sugestões, por considerar ser importante avaliar as medidas tomadas no ano letivo passado de forma a compreender o que pode, ou não, resultar da manutenção do sistema que foi aplicado.
AS MEDIDAS DE 2020
Sabemos que, devido à atual pandemia, no ano letivo passado tivemos de realizar uma profunda alteração às regras de conclusão do Ensino Secundário e Acesso ao Ensino Superior. Como pequena revisão do assunto, recordemos que:
1. O Ministério da Educação mudou as regras de conclusão do Secundário, excluindo a necessidade de realização de Exames Nacionais para a conclusão das disciplinas, remetendo assim os exames apenas para Prova de Ingresso para Acesso ao Ensino Superior.
2. Por outro lado, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior alterou a fórmula de cálculo da média do Ensino Secundário para efeitos de candidatura ao Ensino Superior, fazendo com que todos os alunos deixassem de ter a ponderação dos Exames Nacionais na sua média, ou seja, todos os alunos (com exames válidos) tiveram a sua Média do Secundário calculada apenas com as suas notas internas das disciplinas.
3. A exceção da regra anterior aconteceu apenas para os alunos em que um Exame Nacional realizado no ano anterior lhes aumentava a nota interna, mantendo assim a sua nota mais alta.
4. Também os alunos do Ensino Profissional e Artístico, ou do Ensino Recorrente, deixaram de ter essas ponderações, entrando apenas com a nota final do seu curso.
5. Estas medidas resultaram na impossibilidade de realização de melhorias às notas internas através da realização de exames, o que gerou uma grande contestação por parte de milhares de alunos, tendo inclusive criado uma petição publica que, conjuntamente com a Inspiring Future, foi ouvida em Assembleia da República, assim como várias propostas de alteração do decreto-lei por parte de partidos políticos.
O QUE ESPERAR DE 2021
Vejamos então como é que a replicação destas medidas poderia influenciar o Acesso ao Ensino Superior em 2021:
Nota: Os próximos tópicos são considerações (e/ou sugestões) sobre o que poderá ser o processo de Acesso ao Ensino Superior no presente ano letivo. De forma nenhuma devem ser encarados enquanto informação oficial, ficando a aguardar por confirmação das entidades competentes.
A - Calendário:
O calendário dos exames já foi adiado, pelo que o calendário de Acesso ao Ensino Superior terá de sofrer alterações, tal como no ano passado. Estas alterações de calendário não trazem, em si, graves problemas aos alunos. Podendo até tornar mais fácil o entendimento das regras de utilização dos exames de 1ª e 2ª fase no Concurso Nacional. Porém, deixa por resolver o problema dos alunos que pretendem realizar como externos, alguma Prova de Ingresso que seja feita no mesmo dia e hora, que em situação normal poderia depois ser feito em 2ª fase e utilizado ainda na 1ª fase do concurso.
B - Inscrição nos Exames Nacionais
Visto que o processo de inscrição para os Exames Nacionais deveria começar no final deste mês de fevereiro, e não há indícios de voltar a haver atividades letivas presenciais, o modo online (por e-mail ou plataforma) adotado no ano passado deverá manter-se ou, melhor ainda, ser aperfeiçoado – fazendo por evitar a duplicação do processo digital e em papel. Considerando que os procedimentos de Acesso ao Ensino Superior já estão tão informatizados, seria excelente que o Júri Nacional de Exames finalmente avançasse com um sistema digital definitivo e eficaz para esta situação.
C - Inscrição nos Pré-Requisitos
Também o prazo para a inscrição nos Pré-requisitos deverá ser alargado por parte das Instituições de Ensino Superior, dado que o confinamento geral deverá manter-se até à data da realização dos mesmos. Mas seria benéfico para todos os candidatos que fossem definidas datas e condições específicas para todo esse processo, visto que, no ano passado, apesar de muitas instituições terem alargado ou adiado os seus prazos, toda a informação estava dispersa e incompreensível.
D - Exames Nacionais - Perspetiva do Ministério da Educação
A medida implementada pelo Ministério da Educação sobre a realização de Exames Nacionais apenas enquanto Prova de Ingresso, veio a conseguir uma grande diminuição do número total de exames a ser realizado - como tínhamos previsto já em abril do ano passado, só o exame de Português sofreu um corte de cerca de 70%. Esta medida veio facilitar toda a operação logística dos exames, pelo que prevemos que, com um panorama de pandemia e confinamento ao longo deste ano letivo, o mais provável é que essa regra se mantenha como intenção de reduzir o número de provas a realizar.
A posição da Inspiring Future sobre esta medida foi sempre favorável no sentido de diminuição de provas, mas também é sabido que somos contra a impossibilidade dos alunos de realizarem as provas enquanto melhoria das notas internas.
Mas para compreendermos as implicações desta medida, temos de analisar mais a fundo a forma que estas vão influenciar todo o sistema, no presente e no futuro. Para isso, temos de ter em atenção muitos aspetos:
A nota de conclusão de uma disciplina (CFD) do Ensino Secundário ficará para sempre associada ao aluno e ao cálculo da sua média do secundário. A medida implementada no ano passado, faz com que as disciplinas concluídas em 2020 contem para sempre apenas com a nota interna (CIF) - ou seja, CFD = CIF ao invés de CFD = 0,7xCIF + 0,3 PI - no cálculo da média do secundário destes alunos, mesmo que estes voltem a candidatar-se no futuro.
Isto acontece porque apenas a medida implementada pelo MCTES, no ano passado, confere ao concurso a equidade necessária entre candidatos com diferentes anos de término e, por isso, diferentes formas de cálculo de CFD – ou seja, CFD = CIF para todos – e tem efeito apenas enquanto essa regra for mantida.
Portanto, independentemente de se voltar, ou não, a replicar a medida do Ministério da Educação, precisamos de perceber que todos esses alunos - os de 2020 e, por ventura, os de 2021 - estarão em situação diferente no cálculo da sua média do secundário, a partir do dia em que o MCTES deixe cair a sua medida de equidade. Isto cria um cenário muito difícil de gerir nos próximos anos.
Principalmente porque temos de ter em conta que o peso das notas dos Exames Nacionais no cálculo da CFD resulta maioritariamente numa descida da nota final da disciplina. Isto faz com que os alunos que concluem o secundário com a fórmula de cálculo do ano passado - CFD = CIF – tenham em 2 a 4 disciplinas do seu currículo uma teórica vantagem, no futuro, face aos candidatos que utilizarão a fórmula tradicional - CFD = 0,7xCIF + 0,3xPI.
Sabemos que, de ano para ano, as alterações vão criando pequenas disparidades entre candidatos de anos diferentes - veja-se a recente inclusão de Educação Física no cálculo - mas esta medida em particular ultrapassa completamente as outras variações de vantagem/desvantagem, principalmente porque beneficiará em grande parte os candidatos repetentes, ao invés dos candidatos atuais.
Consideramos que é necessário acautelar-se como é que, no futuro, estes alunos vão poder fazer uma nova candidatura, não comprometendo a equidade do sistema. Uma das opções poderia ser a obrigatoriedade da realização do Exame Nacional em falta, incluindo-o na fórmula de cálculo da média do secundário.
E- Exames Nacionais - Perspetiva do Ministério do Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
Continuando sobre a perspectiva da medida implementada pelo MCTES, também o texto produzido - que pode ser encontrado aqui - não poderá ser parafraseado para o presente ano letivo, dado que terá de ser adaptado para que as provas realizadas tanto em 2021, como 2020, não tenham influência no cálculo da média do secundário. No entanto, os alunos que concluíram o ano passado ou em anos anteriores, poderão continuar a contar com a nota mais alta nas disciplinas em que o exame ainda contou para a CFD, enquanto os alunos que agora concluem o secundário, ficam totalmente impossibilitados de sequer fazer melhorias às suas notas internas de todas as disciplinas através dos exames.
Fará então sentido que a redação deste ano dê essa possibilidade apenas para quem já concluiu uma disciplina há dois anos? Ou este ano não se aplica a ninguém?
Torna-se então importante notar que a forma como o MCTES abordou esta questão foi quebrando a normativa de apenas refletir as notas de conclusão do ensino secundário para efeitos de acesso, aplicando aqui uma regra própria, que define aquilo que considera ser a melhor forma de equidade e meritocracia dos candidatos. Assim, assume que não tem de estar preso a qualquer predefinição do Ensino Secundário, podendo definir as suas próprias regras no cálculo das notas.
Por outro lado, não existindo dados públicos concretos sobre o número de alunos que já concluíram o Ensino Secundário há pelo menos um ano, podemos estimar que existem milhares de candidatos que realizam uma nova candidatura, por exemplo, analisando a idade dos alunos: Em 2018, 13.315 candidatos já tinham 19 anos e mais de 10.000 tinham mais de 20 anos. Assim, pelo menos 1 em cada 5 alunos poderá estar nessa situação.
Fica por resolver um problema reportado no ano passado, em que a medida do MCTES apenas é aplicada aos alunos com exames válidos – 2 anos. Isto porque não sabemos qual o tratamento que foi dado aos candidatos que concluíram o secundário em 2018 pois, nesse caso, a média do secundário desse aluno foi calculada com as disciplinas de 12º sem exames – CIF = CFD - enquanto as disciplinas de 11º foram calculadas com os 30% dos exames - CFD = 0,7xCIF + 0,3 PI ?
Se assim foi, o mesmo aconteceria este ano para com os alunos que concluíram em 2019.
F - Exames Nacionais e as Melhorias
Todas as questões levantadas sobre as diferentes fórmulas de cálculo das disciplinas e da média do secundário relacionam-se também com a questão das melhorias. A verdade é que no ano passado foi produzido um vasto conjunto de informação que defendia a manutenção da melhoria de nota através do exame. Um dos mais fortes argumentos, de certa forma provado por uma sondagem que realizamos , foi que essas melhorias não trariam um grande acréscimo ao número de provas realizadas, facto que depois foi impossível de comprovar com números estatísticos dada a forma de contabilização por parte do Júri Nacional de Exames. Mas se não por esse motivo, pelo menos que tenhamos em consideração que muitos alunos precisam dessas melhorias para alcançarem a sua colocação no Ensino Superior, não tendo qualquer outra hipótese de melhorar a sua média do secundário.
Portanto, de forma a resolver muitas das questões mencionadas nos pontos D, E e F, mas também a da impossibilidade da realização das melhorias internas, propomos que o MCTES volte novamente a quebrar com o paradigma do Ensino Secundário e estabeleça que qualquer exame realizado este ano possa substituir a CFD em caso de nota mais alta, mesmo em caso de disciplinas deste ano letivo. Ou seja, apresenta imediatamente uma melhoria aos alunos que no ano passado a viram negada, apresenta a hipótese de que ao realizar um exame este ano, se melhorar face à Nota Interna, posso utilizar essa nota mais alta. E ainda resolve qualquer aluno que, em qualquer ano, tenha tido uma nota de exame melhor.
Assim: CFD = CIF se PI < CIF; CFD = PI se PI > CIF para todos os alunos.
G - Novo Começo?
Por fim, voltando ao tema de acautelar-se o futuro destes candidatos em candidaturas posteriores, sabendo à partida que vamos ter muita dificuldade de resolver esta equidade no futuro, se não seria este o momento de adotarmos formalmente um período de transição, assumindo a manutenção destas regras até 2022, e trabalhando desde já para o debate e reposicionamento do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior, que muito se tem falado, mas pouco é feito, pois uma alteração do sistema a ser aplicada até setembro do presente ano, poderia trazer frutos de um novo sistema já em 2024 – pois seriam os alunos que entram no 10º ano em 2022 – fazendo até lá, prevalecer este período de transição.
E tu? Deixa-nos as tuas opiniões sobre estes temas enviando um e-mail para: geral@inspiringfuture.pt