O Guia da Interpretação Poética: Como ter 20 a português

Redatora com Futuro
9 maio 2019

Ah, a poesia!... Para uns, um oceano vastíssimo e fascinante, onde é fácil e delicioso ficar perdido por horas. Para outros, um tsunami gigante e assustador que convida desesperadamente à fuga e à anulação da disciplina de português. 

Embora o gosto da poesia seja algo maioritariamente inato, o ódio não é. Isto porque, muitas das vezes, esta aversão não advém da dificuldade em achar beleza nas palavras: advém da dificuldade em achar conexões entre elas. Como é possível gostar de algo que não se compreende? Como é possível interpretar um texto que parece constituído por palavras “aleatórias”? Como é possível distinguir um rio de um ”rio”? Passamos a explicar.

Entra no estado de espírito do poeta

Os poetas são autênticos artistas. Sensíveis, atentos, dispostos a partilhar os seus devaneios com o mundo e capazes de o fazer com uma mestria invejável. Embora estes sentimentos geralmente se encontrem bastante disfarçados, são eles a essência de todo o poema, sendo por isso fulcrais para a sua compreensão.

Dito isto, eis a regra nº1: lê o poema com a máxima atenção e tenta deduzir o estado de espírito do sujeito poético. Procura palavras-chave aliadas a dados recursos expressivos (por exemplo, no poema “Cansaço” de Álvaro de Campos, existe uma repetição constante da palavra “cansaço”, evidenciando o estado do sujeito poético) e esforça-te por ler o poema segundo essa perspetiva.

Presta atenção às simbologias e duplos sentidos

Em poesia, é extremamente comum encontrar alusões a coisas concretas de modo a fazer referência a realidades mais abstratas. Por exemplo, as flores são muitas vezes utilizadas como símbolo da efemeridade da vida, já que a sua beleza estonteante desvanece com o passar do tempo, acabando por desaparecer.

Contudo, existem palavras cujo sentido literal não pode ser desprezado, embora a sua faceta abstrata esteja também presente. Por exemplo, no poema “Vem Sentar-te Comigo Lídia, à Beira do Rio”, Ricardo Reis faz referência a um rio que é, de facto, um rio, mas que, simultaneamente, representa a passagem do tempo e o correr da vida rumo à morte.

Foca-te nos últimos versos

Embora um poema tenha de ser analisado como um todo, geralmente é no final do mesmo que as ideias principais tendem a ser desvendadas mais explicitamente, já que é feita uma conclusão que busca dar um desfecho ao texto e esclarecer minimamente o leitor (por causa disso, em certos sonetos, o último verso é mesmo designado por “chave de ouro”).

Ao compreender os últimos versos, torna-se mais simples compreender os restantes, uma vez que sabemos que têm de estar relacionados com a ideia que extrapolámos do fim, servindo provavelmente como base da mesma.

Liberta-te!

Por mais desafiante que possa ser (tornando tentador fazer uma abordagem puramente racional e metódica), a verdade é que a poesia não passa de uma arte. Assim, exige abertura por parte do leitor para compreender que um poema não é (nem é suposto ser!) algo objetivo e suscetível a uma só interpretação.

Por isso, na altura de interpretar poesia, não te pressiones demasiado: é importante saberes relaxar, conectares-te com o texto e deixares-te levar pelas palavras. Quem sabe, talvez te surpreendas ao descobrires onde és capaz de chegar.